Noticia
Professor e ex-aluno transformam aulas experimentais em exemplos de inclusão social
Como promover acessibilidade para cegos em experimentos que se utilizam essencialmente de referências visuais? Esse era o desafio dos docentes de Licenciatura em Química quando o Leonardo Daniel entrou no curso, em meados de 2010. Durante dois anos, o recém-formado era ajudado por colegas nas atividades práticas, até que, no quinto período, foi convocado pelo professor Sérgio Santos para avaliar e testar produtos de sua nova iniciativa: o desenvolvimento de tecnologias assistivas que convertiam peso, luzes e cores em som. Juntos, ambos transformaram as aulas experimentais de laboratório em exemplos de inclusão social e humanidade.
“Quando o Leonardo chegou no curso, eu era coordenador, e nós não tínhamos nenhum tipo de recurso para auxiliá-lo além da leitura de textos e da orientação espacial. Foi quando comecei a idealizar alguns instrumentos como a balança adaptada, o medidor de condutividade e o identificador de cores, que foram apresentados na Semana da Química (dia 19). Para mim, foi uma mudança radical de uma pessoa passiva que achava que não poderia ajudar, para alguém responsável pela construção de novas metodologias”, destacou o professor.
A balança mecânica adaptada, que foi tema do Trabalho de Conclusão de Curso de Leonardo, funciona oscilando entre sons constantes e bips, dependendo da quantidade e do material a ser pesado. Já o instrumento de identificação de cores sinaliza, por exemplo, se o meio analisado é ácido ou básico, por meio de emissões sonoras distintas. O medidor de condutividade, por sua vez, indica a intensidade da condução elétrica por meio da intensidade do som, numa relação diretamente proporcional. “Os equipamentos são construídos no sentido de inclusão verdadeiramente, então não só o aluno com deficiência visual poderá identificar a estrutura da matéria, mas a turma inteira, da mesma maneira e com o mesmo nível de qualidade”, explicou Sérgio.
Mesmo depois de formado, Leonardo continua tendo encontros periódicos com seu mentor, às quintas-feiras, para avaliar os métodos que seguem em desenvolvimento, testando e sugerindo o que precisa melhorar. E Sérgio, recentemente, tem feito primeiros contatos com um dos alunos cegos do ensino técnico integrado, Lucas Caetano, de Instrumento Musical, para que ele tenha acesso a essas novas tecnologias - o intuito é transformá-lo num vetor de educação: “Se o aluno sair daqui do Instituto, independente de desejar cursar Química ou não, poderá sinalizar a outros professores que determinadas metodologias e instrumentos são possíveis, esclarecendo o que pode ser feito para ajudar nas suas capacidades”.
Novos olhares
Tanto para Leonardo, como para Sérgio, todo o processo de desenvolvimento da inclusão social provocou uma série de mudanças internas. O recém-formado, que enfrentava a vontade de desistir dos estudos, a vergonha de se apresentar como deficiente visual, e o preconceito por parte de alguns alunos, encontrou forças para superar as barreiras do dia a dia: “Me ajudou a participar de projetos e a perder o receio de me apresentar em público. Também me fez enxergar a química e a vida de outra forma, porque eu tinha uma visão muito limitada, de que não era capaz de fazer nada. Hoje, tenho muito mais confiança e autonomia.”
Do mesmo modo, o professor do IFPB ensaiou: “Em 2010, eu não me achava capaz de ensinar para Leonardo. Eu achava que ele estava no curso errado. Eu colocava no outro uma limitação que era minha. Depois dele, eu percebi esse preconceito, para poder desconstruí-lo. Se Leonardo tivesse desistido do curso, eu não estaria nem dando palestra. Foi o contato com ele que mudou não só a forma que eu me enxergo, mas a forma que enxergo o mundo.”
Comunicação Social do campus João Pessoa